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sexta-feira, 7 de junho de 2013

Coração Atravessado


Saber que o Deus quis ter coração
É uma das coisas que me faz insistir em crer.
O divino pulsa.
E isso me salva da vida enfartária.
Religião, para mim, é fluxo sanguíneo, vivente,
E permite com que o vermelho da existência alcance todas as partes do corpo.
O Coração do Deus foi atravessado para se tornar exposto.
E nunca o ser humano está tão próximo da Eternidade
Como quando se permite perfurar pela vida
E a sente tocando em seu peito, ainda que com dor.
Respeite qualquer coração atravessado que se aproximar de você.
Talvez seja o Deus, escondidinho, que queira te fazer pulsar novamente.
Todo coração é sagrado quando sangra.
A salvação foi constatada pela lança.
No "Mortus est!" o "Salvus est!".
O que tem aparência de dor insuportável
Talvez seja apenas um instrumento
Para que ao fim da travessia
Você se derrame em sangue e água e possibilidade.
Toda paixão tem um quê de hemorragia.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Da Profissão à Confissão

Pedro professou que o Senhor era o Messias.
Mas Pedro também o negou.
E três infinitas vezes.
Pedro atravessou a pior das noites...
Aquela que consiste ultrapassar as próprias certezas
E ir além das convicções.
Quando as certezas absolutas se enfraquecem diante das próprias fragilidades,
Desaguamos no insondável da misericórdia.
E o mesmo Cristo professado por Pedro
Quis que a profissão de fé se tornasse confissão de Amor.
"Pedro, tu me amas?"
E ele, reconciliado, foi apascentado para apascentar.
O que se crê só tem sentido no que se Ama.
No amor, todas as negações se convertem em chance.
Convertido é o que transformou as certezas da razão
Em aposta no amor.
Quando a profissão se transforma em confissão,
É porque o Deus já excedeu os limites da compreensão.
E todo "não" morreu no abraço em forma de "sim".

quarta-feira, 8 de maio de 2013

Insuportável

"Muitas coisas ainda tenho a dizer-vos, mas não as podeis suportar agora" (Jo 16,12)
A mensagem do Evangelho tem um quê de insuportável.
Para quem não crê, tudo se torna insuportável como peso.
Para os que creem, reconhecer que há algo que não se suporta sozinho
É o primeiro passo para buscá-lo.
Há um abismo entre o desejo e a busca.
Nem sempre quem deseja vai atrás do desejado.
E o espaço entre os dois se chama mediocridade.
A fé é a atitude de, mesmo não suportando, insistir...
E crer que além do peso extenuante do dia-a-dia,
Existe algo que resta a ser dito
Em forma de inspiração.
E que se revela na transpiração lenta de quem carrega o insuportável.
A salvação foi carregada em passos trêmulos...


segunda-feira, 29 de abril de 2013

Nisto reconhecerão

A fé cristã se distingue no amor.
A novidade do Evangelho reside no fato da Palavra se tornar Carne.
A Lei se tornou Pessoa.
O amor cristão é o ultrapassamento no homem, da Letra ao Gesto.
O que tornou o cristianismo uma religião universal,
E que o permitiu cruzar fronteiras e superar limites e perseguições
Não foi uma teoria bem explicada, ou um ideal retirado de livros empoeirados.
Foi uma Pessoa traduzida em muitas.
Foi um Êxodo em forma de Gente.
Jesus, em si, atraiu o ser humano a amar como Ele.
Ser reconhecido pelo amor é sempre mais difícil.
O amor não procura se auto-promover, não dá alardes.
O amor é sempre discreto.
Ser reconhecido pelo amor implica sair da escravidão de "si"
E lançar-se no deserto das incertezas em forma de outro.
Ele começa afetivo,
Aos poucos se efetiva,
Mas só pode ser cristão quando se torna oblativo.
Ser "amor" sugere que cada ser humanos seja uma Páscoa,
Uma travessia solitária, mas absurdamente povoada pelo divino,
Que em todos se faz desejo e coragem.
O amor é êxodo.
E a terra prometida, um "outro" em forma de espera.

segunda-feira, 22 de abril de 2013

A cerca e as ovelhas

Para ser um bom pastor, seja primeiro uma boa ovelha.
Não faça da cerca uma uma prisão, mas uma ponte para o interior de si.
Nunca a voz do Bom Pastor é tão intensa,
Quando ela é ouvida antes mesmo de ser pronunciada.
Para mim, ovelha boa não é aquela que se esconde no rebanho,
Mas que é o rebanho todo em um único fio de lã.
A pior fuga não é a que se faz pulando as cercas,
Mas a que se opta ao professar que o mundo termina na cerca.
Saber a extensão absurdas das pastagens do além
E preferir as limitações esplêndidas do aquém...
O Bom Pastor também foi Cordeiro.
Ele não pulou a cerca.
Ele trouxe todo o pasto do mundo para dentro dela.


segunda-feira, 15 de abril de 2013

Entre duas margens

João 6,22-29
A diferença entre o discípulo e a multidão está na travessia.
Os discípulos obedecem à voz do Mestre
E não temem atravessar o lago, ainda que a escuridão e a ausência do Senhor os interpele.
A multidão não admite o esforço da busca
E prefere a margem segura às ondas tempestuosas.
Se uma barca ainda permanece vazia,
É para que a ocupemos.
Se ainda há remos à nossa espera,
É para que nossos braços não se enfraqueçam do lado de cá.
O chamado é para todos.
A escuta, de alguns.
A travessia, ainda que longa, é sempre apenas a travessia.
As águas não podem conter o desejo de um encontro.
Entre a margem do interesse e a margem do discipulado
Está a decisão entre uma vida profunda,
Ou de beiradas.

sábado, 13 de abril de 2013

Cada Pessoa é uma Passagem

Para nós cristãos, a Páscoa não é apenas uma data,
A Páscoa é uma Pessoa.
O Corpo do Ressuscitado é o mesmo corpo Crucificado.
Sem a Sexta da Paixão não haveria Domingo da Ressurreição.
Se a vida prevaleceu sobre a morte,
Se o túmulo foi encontrado vazio,
É porque uma passagem foi constatada.
Passamos tanto por essa vida,
Ultrapassamos o tempo com nossos ideais,
E repassamos teorias, pensamentos, e sobretudo incertezas.
Se a Páscoa for apenas uma tradição passada,
A constatação do vazio do túmulo de nada servirá.
Passando da morte a vida,
O Senhor nos garantiu um bilhete, uma passagem,
Não apenas para uma "outra vida" num além insondável,
Mas para o Outro, sempre disposto a nos oferecer assento ao lado.
A Páscoa de Cristo é a nossa passagem para contemplar a humanidade em forma de viagem.
E saber que estamos todos à caminho.
Cada pessoa é uma Páscoa,
Cada pessoa, uma passagem,
Cada pessoa, travessia.
E um vazio incalculável a ser preenchido por encontro.
E esperança.

sexta-feira, 12 de abril de 2013

UM Menino na multidão

A diferença está em como se olha e como se é olhado. 
Para saciar a fome da multidão, Jesus não quis contar com o muito, mas com o pouco. 
Deus não se revela na abundância de recursos, 
Mas no modo como a escassez é suprida. 
A história do menino que apresentou os cinco pãezinhos e dois peixes é a história de todos nós. 
Um mínimo de disponibilidade basta para que o milagre aconteça. 
Aliás, milagre é coisa que brota no mínimo da vida. 
Ele foi olhado não pelo pouco que tinha para oferecer, 
Mas pelo desejo de fazer com que seu pouco saciasse a muitos. 
O mundo nos olha como um a mais na multidão, 
Deus nos olha como únicos. 
Se aos olhares do todo, somos minúsculos, 
Ao olhar de Cristo, somos um universo de possibilidades. 
Fé é a atitude de saber-se olhado pessoalmente. 
Caridade é o modo de ver pessoas ao invés de multidões. 
Religião é aquilo que une o mínimo ao que vai além do máximo. 
Aos olhos do Senhor somos todos meninos. 
Um mínimo que se sabe pessoa já é prenúncio do máximo.